Archive for 2010

Crítica: Tron - O Legado

Posted by Programa Enter

Por: Ronaldo D'Arcadia

Quase trinta anos depois o universo de Tron continua um lugar a ser visitado, mas dessa vez de forma menos interessante.


Quando “Tron - Uma Odisséia Eletrônica” foi lançado eu nem ao menos havia nascido, mas desde muito cedo já via nele um diferencial gritante: a audácia de empregar um visual único alicerçado pela computação gráfica da época, os famosos “efeitos especiais”. Muitos anos se passaram, e o universo de Tron continua um lugar atual, vintage e ao mesmo tempo contemporâneo, com o potencial de render novas histórias e mais alguns milhões em bilheterias (e complementos).

A história começa com Kevin Flynn (Jeff Brigdes) contando ao seu pequeno filho Sam as inúmeras possibilidades revolucionarias de seu trabalho, e como anseia em compartilhar isto com ele. Isto nunca ocorreu, devido aos acontecimentos do primeiro filme. O garoto então cresce sem o pai, mas sempre enxergando sua sombra na rentável corporação Encom de tecnologia. Mesmo tendo uma relação de “padrasto e filho revoltado” com a diretoria da empresa, o jovem rapaz é peça presente do patrimônio, que poderia estar em suas mãos, mas por escolha não está. É então que algo estranho ocorre, levando Sam a visitar o antigo fliperama de seu pai. Lá ele encontra sua passagem de ida para a “Grade”, esta espécie de universo metafísico onde programas vivem em sociedade.

Logo sendo capturado por um típico firewal, o sistema acaba não reconhecendo que programa Sam é, mesmo ele afirmando não ser um programa. Sua sentença é participar dos temidos “jogos”, uma arena de gladiadores que serve de diversão para a Grade enquanto elimina softwares desconhecidos. Sua única chance é escapar de lá, para assim buscar respostas com aquele que criou todo este universo, seu desaparecido pai.

O mote central de “Tron – O Legado” é a relação pai e filho. Toda a criatividade do universo é o principal fator que instiga a trama, que no final fica em segundo plano, perdendo para o visual arrojado e trilha sonora excepcional (realizada pelo Daft Punk, dupla francesa de música eletrônica que aparecem como DJ’s mascarados). Sendo registrado parcialmente em 3D, o filme traz um aspecto maravilhoso, com o escuro universo da Grade iluminado por seus prédios e habitantes bizarros. A repaginada do visual (mediante ao primeiro longa) foi de bom gosto, tornando tudo muito mais limpo e afiado.

Filmado pelo diretor estreante Joseph Kosinski , o filme traz cenas de ação de qualidade, cheio daqueles clichês que todos adoram, como muito slowmotion (tipicamente “Matrix”), profundidades de 3D bem trabalhadas, e um quesito que pode se dizer ser o mais interessante de todos: a brutalidade da morte suavizada em forma de cubos. Outro ponto mais que positivo, sendo uma evolução que faz jus ao nome Tron, é a qualidade digital de Clu, personagem vilão que é uma cópia exata de Jeff Bridges nos anos oitenta. Seu realismo é incrível e talvez até confunda os mais desavisados.


Mas como um todo “Tron – O Legado” possui diversos problemas. Primeiramente, o roteiro não tenta, ou nem se importa em tentar transformar seu herói principal Sam em alguém carismático, sendo ele raso e distante do público. A atuação pouco convincente de Garrett Hedlund colabora com esse resultado, e a falta de conteúdo de seu personagem é clara depois de frases de efeito furadas como “Você deve estar de brincadeira!”. Outro problema grave é a amnésia que o filme sofre após entrar na Grade. Logo no início, somos apresentados a diretoria da Encom, que aparentemente tenta enterrar o nome Flynn e alçar voos capitalistas mais altos. Este contexto é simplesmente esquecido, o que explica a ponta não creditada de Cillian Murphy, que até aparentava ser o vilão da vez, mas talvez fique para a próxima. Toda esta inconsistência se expande por toda a história e seus personagens, que no final não conseguem se desenvolver de forma satisfatória.

Só que mesmo com o roteiro fraquíssimo não colaborando, Jeff Bridges em alguns momentos emociona com o amor paterno de seu Kevin Flynn e Olivia Wilde esta linda e versátil como a essencial Quorra, guerreira que precisa ser protegida. Ainda falando sobre os atores, temos o excelente Michael Sheen transvestido de David Bowie (vulgo Ziggy Stardust) interpretando o maluco Castor. E só. E o programa Tron por onde anda? Ou Alan Bradley? Bem, ele pelo menos é inserido, de forma capenga por sinal .

Sendo um high concept de primeira, que visa lucrar muito com seus inúmeros brinquedos e jogos, fica a sensação de que faltou muito feeling na hora de se produzir este filme. O visual diferenciado com certeza arrastará multidões para o cinema, mas isso não apaga os inúmeros defeitos de roteiro, e um personagem principal sem carisma interpretado de forma duvidosa. Como disse em outras críticas, agora volto a dizer, como nenhum filme vive apenas de cenas mirabolantes de ação, o resultado é simplesmente morno. Uma decepção.

Crítica: As Crônicas de Nárnia – A Viagem do Peregrino da Alvorada

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Por: Ronaldo D'Arcadia

Apesar do poderoso universo de C.S. Lewis, este novo filme da franquia não apresenta nada de novo, e cada vez mais perdemos a fé nela.

A franquia “As Crônicas de Nárnia”, baseada no mundo criado por C.S. Lewis, nunca foi um êxito total. Atores sem experiência e produções claramente controladas sempre foram os agravantes desta máxima, juntamente é claro a difícil missão de transferir de forma respeitável as histórias dos livros para as telas. Nesta terceira parte, embarcamos no navio Peregrino da Alvorada, para agora explorar os oceanos de Nárnia e suas misteriosas ilhas. Mas esta viagem pode causar certo desconforto.

Tudo começa quando os irmãos Lúcia e Edmundo se encontram entediados na casa de seus tios, naquilo que deveriam ser férias. Para piorar tudo, além da guerra - que ainda perturba o sono dos ingleses -, tem o chato primo Eustáquio Scrubb (Scrubb que pode ser traduzido como Mísero). Irritante até no nome e sobrenome, o garoto gosta de infernizar seus primos sendo o anfitrião mais antipático possível. Mas o destino pregaria uma peça bastante disciplinar em Eustáquio. Ele e seus primos não esperavam, mas o belo quadro de um navio em águas turbulentas que ficava no quarto de hóspedes era uma janela para Nárnia, e para lá eles literalmente emergiram, a bordo da magnífica embarcação em forma de dragão.

Em meio a muitos protestos do mimado Eustáquio, o barco segue seu caminho rumo a uma missão de suma importância para Nárnia. Com o Rei Caspian no comando, a expedição precisa encontrar as sete espadas dos sete Lordes desaparecidos, e para isso terão de enfrentar seus piores pesadelos. O inimigo agora está na mente de cada um deles.

Aqueles que conhecem a obra original de C.S. Lewis perceberam mudanças claras na história. Ao invés de procurar Lordes eles essencialmente procuram espadas, e não se surpreenda se a Grande Névoa der as caras por aqui. Todas as mudanças foram feitas sob o argumento de “deixar o público cativado”, como se o texto original não fosse capaz do mesmo.


A direção do filme é de Michael Apted, britânico que tem extenso currículo, principalmente em produções para TV. Apesar de retratar belos momentos, quase todos alicerçados por maciços efeitos especiais, suas cenas em diversos momentos perdem o timing e acabam se tornando monótonas e maçantes. Parte da culpa está também no roteiro do trio Christopher Markus, Stephen McFeely e Michael Petroni, que praticamente até hoje só trabalharam na franquia. O humor é desconcertantemente sem graça e até mesmo bons personagens, como Eustáquio, acabam soando caricatos em excesso. Os dilemas de Lúcia, por exemplo, são trabalhados de forma superficial, como se fosse uma obrigação citá-los. Embates entre Caspian e Edmundo parecem pouco naturais. Mesmo toda a simbologia de fé e cristianismo está escassa. Sendo o segundo filme o mais contundente na abordagem de Aslam/Deus, neste, o tema fica renegado a poucos momentos finais.

Talvez a escolha de Dante Spinotti para dirigir a fotografia não tenha sido a mais acertada. Spinotti é um excelente profissional, que já trabalhou com perfeição para grandes diretores, sendo sua parceria mais produtiva com Michael Mann, com quem realizou “Inimigos Públicos”, “O Informante” e outros. Seu estilo de fotografia é incrível e diferenciado, onde com pouca iluminação, sua captação parece tão natural que se assemelha a uma câmera de mão de alta qualidade. Mesmo Mann, quando não trabalha com ele, costuma copiar seu estilo, por trazer um realismo intenso para cenas de tiroteios noturnos. No caso de Nárnia, todo esse realismo acabou não funcionando de forma adequada, e os garotos, vestidos com roupas pesadas e espalhafatosas, mais pareciam estar fantasiados do que propriamente vestidos. Uma película mais requintada e densa seria uma ótima solução neste caso.

Tendo a obrigação de segurar o papel principal do longa, a dupla Georgie Henley e Skandar Keynes, respectivamente Lúcia e Edmundo, fazem o que podem. Sendo atores iniciantes, que tem apenas a franquia Nárnia como background, suas interpretações deixam a desejar, faltando em certos momentos carisma em Skandar e mais flexibilidade em Georgie, que apesar de possuir um brilho próprio, precisa amadurecer como atriz. Ben Barnes está correto, mas não chama atenção com seu Caspian, sendo que o grande destaque é, querendo ou não, Will Poulter, como o pentelho Eustáquio. O ator mirim possui uma aparência tão inusitada que parece tirado de algum conto do desenhista Hergé, e seu entusiasmo é excepcional. Com o ótimo “O Filho de Rambow” no currículo, o garoto chama atenção, conseguindo captar o ar insuportável do personagem, e depois, obviamente, redimi-lo. Com certeza o melhor personagem, e mais bem trabalhado, é o rato Reepicheep, dublado pelo sempre excelente Simon Pegg. O pequeno espadachim se torna a babá de Eustáquio, e desta relação surgem as melhores piadas e os momentos mais dramáticos. Pegg desaparece na voz do pequeno guerreiro, e faz um trabalho competente.



“As Crônicas de Nárnia – A Viagem do Peregrino da Alvorada” tem seus bons momentos, com belas cenas computadorizadas e um final dramático de bom gosto. Mas todo o resto acaba se tornando um passeio cansativo, com cenas de ação pouco aproveitadas, embates psicológicos rasamente explorados, interpretações automáticas e roteiro equivocado. Infelizmente uma obra que não faz jus a seu criador C.S.Lewis.

Crítica: A Rede Social

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Por: Ronaldo D'Arcadia

I’m CEO, B**ch!


 Toda a história do Facebook propõe uma bela ficção, ainda mais quando contada pelas mãos mais que competentes de David Fincher, aclamado diretor de clássicos modernos como “Clube da Luta” e “O Curioso Caso de Benjamin Button”. Sendo primeiramente visto como um projeto inusitado, o filme é hipnotizante do começo ao fim, e traça passo a passo a velada guerra daqueles que um dia foram parceiros de negócios, e também amigos.

Mark Zuckerberg, criador do Facebook, mais novo bilionário da história e potencialmente um Bill Gates desta geração, é esmiuçado com um olhar clínico, que por vezes vangloria sua inteligência e sagacidade, assim como expõe todos seus defeitos claramente perceptíveis. Conclusivo e preciso como uma máquina, o jovem prodígio agia como uma, controlando seus sentimentos, seus amigos e trabalhos de forma assustadoramente fria e calculista. Em um mundo que se rendeu a era digital, Zuckerberg era rei e o Facebook seu reinado, um reinado que de tão importante se tornou maior do que ele ou qualquer outro que atravessasse seu caminho.

Roteirizado de forma auspiciosa por Aaron Sorkin (Jogos do Poder), a história apresenta fatos contundentes desta disputa judicial acirrada. Hora vemos Zuckerberg encarando Divya Narendra e os gêmeos Cameron e Tyler Winklevoss, pretensos criadores de uma idéia que poderia ter se transformado no Facebook. Já no outro corner temos Eduardo Saverin, brasileiro tido como co-fundador do site e também único amigo de Zuckerberg na época, que o trairia posteriormente. Alicerçada pelo livro de Ben Mezrich “The Accidental Billionaires: The Founding of Facebook, a Tale of Sex, Money, and Betrayal” (livro que teve Saverin como principal fonte), a história contada parece tirada dos autos do caso, em cenas simplesmente eletrizantes onde o nível intelectual de Zuckerberg se destaca, sendo muitas vezes inteligentemente evasivo e também cruelmente verdadeiro.

Em meio a isso, de forma atemporal, a história se desenrola conforme vai sendo citada neste julgamento de gente grande (grande conta bancaria). Está tudo lá: a chacota com Harvard e sua respeitável rede que foi abaixo depois do compartilhado Facemash, a evolução ensandecida do novo thefacebook, a ira dos traídos, a idolatria por Sean Parker, sujeito que simplesmente ensinou a internet a compartilhar seus downloads através de sua Napster, e claro, o início de tudo, o homérico fora de Zuckerberg, que o deixou bêbado e potencialmente criativo (ou seria vingativo?). Tudo devidamente registrado em seu blog, no qual escrevia simultaneamente enquanto programava tudo e todos ao mesmo tempo.

Com um nível de amadurecimento além das expectativas (já muito boas), a destreza do diretor David Fincher se revela em cada cena. A precisão dos movimentos de sua câmera, o respeito e atenção com que aborda seus personagens e locais - como a apresentação dos títulos iniciais que revela Harvard de forma gradualmente bela-, e com cenas de impacto sem igual- como a disputa de remo que parece ser filmada por um Kubrick moderno. Com montagem simétrica e fotografia excelente (de Jeff Cronenweth que fez “Clube da Luta”), o filme funciona em todas as camadas. Ponto forte fundamental é a trilha sonora de Trent Reznor (da banda Nine Inch Nails) e Atticus Ross. Sendo uma mistura homogênea, ela é clássica e sutil quando aborda cenas de contemplação, e pulsante, eletrônica e orgânica quando quer instigar suas sequências perfeitamente amarradas.

Seguindo a mesma linha de todas suas obras, Fincher consegue tirar tudo de seus atores, neste caso, jovens em ascensão. Jesse Eisenberg já mostrou que gosta de flertar com o humor em filmes como “Zumbilândia” e “Férias Frustradas de Verão” (péssimos nomes, se me permitem comentar), mas foi como Zuckerberg que ele realmente provou ser um ator digno de nota. Não fugindo muito de seu estereotipo, Eisenberg emprega de forma madura e assustadoramente competente o tom robótico de seu personagem, e no mínimo merece respeito por despejar toneladas de frases absurdamente complicadas sem ao menos piscar, proeza que se torna difícil até para os mais experientes rappers da atualidade. Mesmo que aprisionado a esta chatice latente, o ator consegue sutilmente fazer com que as emoções desse Zuckerberg de Fincher sejam exploradas, o tornando humano, e assim demonstrando como somos privilegiados por termos relações mais enfáticas do que o garoto bilionário. Sua camuflada fraqueza faz dele o anti-herói atormentado que ganha o público.

Ainda no mesmo nível, Andrew Garfield apresenta muita naturalidade em cena como o brasileiro Eduardo Saverin. Muito mais passional, seu personagem é o coração mais humano entre todos, fazendo de seu carisma a vergonha da traição de Zuckerberg. Justin Timberlake também chama a atenção com seu Sean Parker, nerd figurão que traz um histórico de polêmicas para a fundação do Facebook. Seu raciocínio acelerado e simpatia vão de encontro com sua falsidade congênita. Temos ainda Armie Hammer ao dobro como os honrados cavalheiros de Harvard, os irmãos Winklevoss, Rooney Mara como o amor perdido Erica Albright e Rashida Jones como a advogada assistente Marylin Delpy, que mostra para Zuckerberg que nem tudo está perdido para ele no assunto “relacionamentos”.


Como disse no início, querendo ou não, tudo é ficção. Talvez a invenção do Facebook não tenha sido esse drama todo, mas inegavelmente o filme de David Fincher, através de um simbolismo ampliado e utilizando de códigos variados, consegue alcançar um resultado que pode ser considerado algo bem próximo da realidade. Com um roteiro dinâmico e perfeitamente talhado, com diálogos inteligentes, por vezes psicologicamente arrasadores, a obra se torna mais uma pérola na coleção do diretor. Filme para se ver várias vezes.

Crítica: Scott Pilgrim Contra o Mundo

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Por: Ronaldo D'Arcadia

Insano, barulhento, acelerado. Este filme é uma festa para os olhos daqueles que buscam mais vida e atitude no cinema moderno.

“Scott Pilgrim Contra o Mundo” pode ser considerado um filme destinado para um público específico. Talvez o longa seja demais para aqueles acostumados a uma história mais linear e, fatidicamente comum, fato que explica a fria recepção lá fora. Baseado no aclamado graphic novel de Bryan Lee O'Malley, o filme conta a história de Scott Pilgrim, baixista arrasador, conquistador nato e exímio lutador. Depois de idas e vindas de sua vida amorosa, ele parece ter encontrado a garota de seus sonhos (literalmente). Ramona Flowers é tudo aquilo que um rapaz descolado quer: misteriosa, independente, espontânea e cheia de atitude, o único problema são suas cicatrizes de guerra, ou seja, seu passado amoroso, constituído mais especificamente de sete ex-namorados do mal, todos empenhados em destruir seus relacionamentos (novamente, literalmente). Fica então a cargo de Scott defender sua posição e assim derrotar esta liga barra pesada, para no final ter o caminho livre com Ramona.

Primeiramente é importante frisar, para os fãs da graphic novel, que muita coisa foi transformada. Algumas com um resultado muito positivo, outras nem tanto. Seguindo praticamente ao pé da letra o primeiro volume “Precious Little Life” (fundamental por explorar o inicio do relacionamento de Scott e Ramona), o texto acaba dando aquela embolada básica em todo resto. Tendo 112 minutos de projeção, com uma hora de filme Scott acabou de enfrentar Lucas Lee, o que exemplifica um pouco como o filme teve de correr com sua finalização. Mas no geral, o roteiro de Michael Bacall e do diretor Edgar Wrigth funciona bem, não é perfeito, pois após o primeiro ato impecável, o filme dá uma pequena caída no rendimento, mas suas soluções acabam sendo de bom gosto até o desfecho.


Mas com certeza o grande diferencial da obra é a parte técnica. A direção de Wright é eletrizante. Tendo os excelentes “Todo Mundo Quase Morto” e “Chumbo Grosso” em seu currículo, o inglês eleva a quinta essência o apuro visual, muito diferente da obra original, que opta por um estilo mais cult, todo em preto e branco. Utilizando de efeitos fantásticos, o quesito “game” é realmente debulhado de todas as maneiras possíveis. Juntamente a isso, onomatopéias saltam freneticamente em todos os sons, transformando tudo em uma grande HQ. É a união perfeita entre duas vertentes que nunca haviam sido exploradas de forma tão enfática até hoje. Ainda com muita criatividade, diversos outros elementos pop são inseridos de forma inusitada, como uma homenagem ao seriado “Seinfield”, simplesmente perfeita, a vinheta da Universal em “8bits” também arrasa, ou mesmo toda a parte musical que, apesar de não ter as mesmas letras e possuir mais de três notas (diferentemente da HQ), funciona de forma excepcional. Punk rock misturado com british rock, uma doidera só.

A edição e montagem rápida e insana, herança do cinema inglês de Guy Ritchie, aqui é reinventada. Sendo parte fundamental do êxito visual, suas passagens e cortes bruscos dão a continuidade frenética e muitas vezes não linear do filme. Muita qualidade também na direção de arte, onde as cores ganham vida de forma incrível. Trilha sonora contagiante, efeitos especiais inesquecíveis. O filme se sai bem em todos os quesitos.

O time de atores também é destaque. Michael Cera foi a escolha certa para o papel principal. Com cara de nerd, franzinho, e com um “timing” para comédia diferenciado, seu Scott tem o carisma necessário para conquistar o público. Ele trabalha muito bem todos os dilemas reais de uma geração, se tornando assim um símbolo de fácil associação. Mary Elizabeth Winstead também se sai bem como Ramona. Além de parecer muito com a figura da HQ, sua seriedade contrasta paralelamente com seu charme, e sua busca por um relacionamento verdadeiro se torna uma motivação perspicaz, mediante ao público que busca atingir. Não menos importante, e se destacando dos demais, temos Ellen Wong como a perseguidora apaixonada de Scott, Knives Chau. A atriz imprime trejeitos irresistíveis para a personagem, passeando facilmente entre a menina meiga e a louca varrida. Já entre os amigos de banda de Scott temos Alison Pill como a durona e hilária baterista Kim Pine, Mark Webber é o talento paranóico Stephen Stills, e Johnny Simmons é o sonso boa gente Young Neil, também com um humor de qualidade, chamando a atenção.

No time dos vilões estão nomes de peso como Chris Evans, interpretando o mala Lucas Lee, Brandon Routh é o poderoso vegano Todd Ingram, e o excelente Jason Scwartzman aparece influente como Gideon Graves. Outros destaques são Kieran Culkin como o impagável gay descolado Wallace Wells (roubando a cena), Anna Kendrick interpreta a irmã fofoqueira Stacey Pilgrim, Brie Larson é a sedutora Envy Adams e Aubrey Plaza faz a desbocada Julie Powers. Um time de peso. Diversos personagens que incrivelmente são todos bem explorados, na medida do possível.

“Scott Pilgrim Contra o Mundo” adapta sua história de forma respeitável. Apesar de comprimir muito coisa, a obra se fortalece nos detalhes, em todo o apuro visual, na direção perfeita de Edgar Wright, e nas interpretações eficientes de seus atores, uma pequena obra prima cult. Com suas influências calcadas no mangá, nos games vintage (com suas moedinhas e tudo mais) e no mundo musical frenético, a obra tem tudo para atrair os jovens brasileiros. Embora tenha sido recebido de forma pouco positiva mundo a fora, o filme com certeza tem um valor inestimável para aqueles que buscam algo diferente em meio à normalidade muitas vezes cansativa dos blockbuster’s em geral.

Crítica: Um Parto de Viagem

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Por: Ronaldo D'Arcadia

Tudo é possível quando Todd Phillips resolve unir Galifianakis e Downey Jr. em uma viagem cruzando os EUA .

Para aqueles que achavam que “Se Beber não Case” foi um golpe de sorte orquestrado por Todd Phillips, “Um Parto de Viagem” veio mostrar que realmente não foi. O diretor, que possui outros trabalhos medianos em seu currículo (nada muito significativo), parece ter encontrado o tom exato para fazer comédia de qualidade, onde, mesmo sendo muitas vezes apelativo, não perde a linha em momento algum.

Basicamente estruturado no modelo “road movie”, o filme começa junto com o dia de Peter Higman, um arquiteto que precisa voar de Atlanta para Los Angeles e acompanhar o nascimento de seu filho, que ocorrerá nos próximos dias. Preparado para viagem, Higman podia esperar por tudo, menos o que iria realmente lhe acontecer: conhecer Ethan Tremblay, um pretenso ator que usa permanente e sonha ir para Hollywood fazer muito sucesso, com seu cachorrinho Sonny a tira colo.

O primeiro encontro dos dois já é literalmente um acidente, de carro, na porta do aeroporto. Após cinco minutos de conversa, que já proporcionam alguns inconvenientes para o arquiteto, ambos se vêem juntos, muito próximos, no mesmo vôo. Novamente, devido a Tremblay e uma palavra mágica dita dentro do avião (palavra que pode te expulsar de qualquer aeroporto dos EUA e te mandar direto para cadeia), a dupla é expulsa e colocada na lista negra das companhias áreas. Com as bagagens despachadas e sem os documentos, perdidos na confusão, Higman se vê sem alternativas de prosseguir até Los Angeles. É quando surge novamente Tremblay, com seu carro alugado, um pedido de desculpas e uma carona garantida para o suposto novo amigo. O resto é uma sequência de acontecimentos absurdos e hilários, uma verdadeira epopéia a ser lembrada para sempre pelos dois companheiros de viagem.

Todd Phillips coloca então, frente a frente, a sanidade do arquiteto versus a loucura do ator. Mesmo seguindo algumas regras já meio batidas do gênero, o roteiro se mostra muito bem trabalhado, centralizando toda sua força nos ótimos e elaborados personagens, principais e secundários. Ao longo da jornada somos expostos a todos os quesitos obrigatórios do humor politicamente incorreto: piadas com cadeirantes, crianças mal educadas, acidentes, e muitas, mas muitas besteiras ditas, além de uma cena incrível, ao som de Pink Floyd, onde o “remédio” de glaucoma de Tremblay (conhecido também como THC) dá um tom alucinógeno e inesquecível para jornada. Contrastando com o humor de primeira, o texto também explora de forma eficiente os dramas de seus personagens, nos levando a entender e nos afeiçoar ainda mais por eles, como a forte relação entre Tremblay e o pai, que para o bem ou para o mal, foi o responsável pela personalidade extremamente irritante do individuo.


O destaque é com certeza Zach Galifianakis. Depois de chamar atenção com seu débil Alan Garner, de “Se Beber não Case”, o ator retoma a parceria com Phillips, agora como protagonista. Seu Ethan Tremblay é incrível. Muito bem construído e estruturado, suas esquisitices vão ao extremo, desde sua aparente alienação mediante ao mundo ao seu redor, como seus improváveis e intermináveis costumes bizarros. Acompanhado de seu cachorro Sonny (que também tem seus momentos estranhos), o usuário compulsivo de remédio para glaucoma é responsável por todas as desgraças que acontecem estrada a fora. Com muita responsabilidade, Galifianakis se tornou Tremblay. Ele ficou tão bem, que muitos podem pensar que o ator é o personagem, e talvez até seja, pois o papel parece ter sido talhado visando sua excentricidade óbvia.

Junto a ele está ninguém menos do que, o novamente ator do momento, Robert Downey Jr., que também dá um show. Interpretando um papel muito mais contido, ele é a ira do público, o saco cheio prestes a explodir. Com a mesma personalidade de sempre, Downey Jr. humilde mente abre espaço para Galifianakis brilhar, o que é fundamental para obra, fazendo desta união improvável uma química perfeita.

Temos ainda aquelas pequenas participações (obrigatórias em todo “road movie”) que dão um brilho especial ao longa. Juliette Lewis aparece hilária como a vendedora de remédio para glaucoma Heidi. Danny McBride surge revoltado como o soldado Lonnie, que voltou do Iraque não levando desafora nenhum para casa. Sua cena é uma das melhores do filme. Por fim, Jamie Foxx interpreta o amigo Darryl, e é o menos aproveitado dos coadjuvantes, mas tem seus momentos. Recheado de referências, o filme faz ainda uma homenagem criativa e inteligente ao seriado “Two and a Half Man”. Com certeza um ponto a mais para quem é fã de Charlie, Alan e Jake.

A trama de “Um Parto de Viagem” pode parecer simples, pois tem destino certo, com seu ponto de partida e chegada já estipulados. Mas a criatividade e o humor de qualidade do diretor e roteirista Todd Phillips são, sem dúvida nenhuma, um diferencial. Com ótimos atores se divertindo em cena, direção competente e trilha sonora contagiante, o filme é, juntamente com “Se Beber Não Case”, uma das melhores comédias do ano.

Crítica: Machete

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Por: Ronaldo D'Arcadia

Robert Rodriguez tenta fazer um filme bom que parece ruim, mas consegue ser apenas ruim.

 


Respeitado por obras memoráveis como “Um Drink no Inferno” e “Sin City”, o amigão de Quentin Tarantino, Robert Rodriguez, é um verdadeiro fanfarrão. Sempre imprimindo em seus filmes aquele clima “B” de se fazer cinema - herdado de seu “El Mariachi”, que com pouquíssimos recursos ganhou visibilidade mundial -, o diretor aqui parece se confundir, fazendo com que o ruim seja apenas ruim.

A idéia de “Machete” surgiu após o alvoroço provocado pelo trailer falso exibido antes da projeção de “GrindHouse” (“Planeta Terror/ A Prova de Morte”), que fez em parceria com Tarantino. O apelo foi tão grande, que o diretor resolveu tirar o projeto do imaginário mundo “fake” e lançá-lo na realidade. Dividindo a direção com o desconhecido Ethan Maniquis - que sempre trabalhou na área de edição e efeitos visuais -, Rodriguez não se mostra consistente como em seus outros trabalhos, apresentando apenas uma cena inicial arrasadora, e prosseguindo de forma trôpega e sem graça até o final.

Tudo começa com o personagem Machete, um policial mexicano honesto e brucutu, que vê sua família ser violentamente assassinada pelo sarcástico Torrez (chefão do crime organizado local), despertando assim o mais puro ódio calcado no desejo de vingança. Com a policia corrupta a favor de Torrez, Machete foge para os Estados Unidos, e lá tenta tocar sua vida. Tudo isso até uma oportunidade única bater a sua porta: Ele é contratado para matar o Senador John McLaughlin, ativista insano que luta contra a invasão ilegal de mexicanos no EUA de forma terrorista. As coisas não saem como haviam sido planejadas, e Machete terá de se virar para sair dessa arapuca em que se meteu, e ainda acertar suas contas com o passado.

Com um roteiro precário, que basicamente faz do acaso uma fada madrinha, o filme nos faz esperar por uma cena tão boa quanto a inicial, mas ela nunca vem. Claramente que Rodriguez tenta fazer das coincidências, incrivelmente convenientes, um fator cômico na trama, mas o resultado não surge este efeito de forma eficaz. No final, a única força motriz da obra está em alguns personagens inusitados que possuem brilho próprio, mas pouco desenvolvimento dentro da história.

Machete é perfeito. Frio e calculista, ele ironicamente, ao mesmo tempo em que pica seus inimigos como um psicopata, tem uma personalidade honrada, além de pegar a mulherada, mesmo com sua cara mal acabada. Danny Trejo, que interpreta o personagem, se sai bem pelo simples fato de reconhecer que não é um bom ator, por isso parece satisfeito em não proferir mais de dez frases durante o filme todo, um verdadeiro exterminador do futuro versão mexicano. Na pele do senador John McLauglin temos ninguém menos que Roberto De Niro. Seu personagem é puro estereótipo, e o ator se vira para tentar torná-lo mais atraente, mas passa longe de ser um vilão digno de nota. Junto a ele, no time do mal, está Jeff Fahey, este sim mais caricato e engraçado com seu Michael Booth, sendo o bandido mais enfático da fita.

Temos também Michelle Rodriguez como Luz, uma bela revolucionaria que luta pelos diretos dos ilegais. Sua personagem é visualmente emblemática, com suas roupas escassas e seu tapa olho chamativo, um refresco no longa. Já Jessica Alba está caricata com sua agente especial da “La migra” Sartana Rivera, e não desperta nenhum carisma, contribuindo muito pouco com o resultado final. Lindsay Lohan (pós-clinica) está muito bem com sua vingativa April Booth, justiceira que veste o hábito de freira e mata criminosos a sangue frio. Junto a ela, também de batina, o eterno maluco Cheech Marin aparece como Padre Cortez, melhor personagem, que também merecia um filme só dele. Para fechar temos o terrível vilão Torrez, interpretado pelo experiente, mas pouco versátil Steven Seagal. Apesar de sua qualidade muito limitada, o ator entrega o papel de sua vida, com um desfecho que, de tão ridículo, se torna hilário.

“Machete” com certeza embutiu esperanças em todos os fãs de “cult movies” mundo a fora, mas com poucas cenas boas e uma história simplória e esquecível, somos obrigados a ser realistas e constatar que o filme é simplesmente ruim. No final, talvez este seja o grande desejo de Rodriguez, de que o filme seja realmente ruim, para assim, de uma forma diferenciada, ele se torne inesquecível. Vai saber.

MATÉRIA ESPECIAL

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Crítica: Micmacs – Um Plano Complicado

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Por: Ronaldo D'Arcadia

Em meio a tramóias meticulosamente elaboradas, Jean-Pierre Jeunet agrada com um humor despretensioso.



Envolvido em uma áurea cult pintada de verde, vermelho e amarelo, Jean-Pierre Jeunet transpira criatividade. Foi assim com seu surreal “Delicatessen”, com o elaborado “Ladrão de Sonhos”, em sua obra prima “O Fabuloso Destino de Amélie Poulain” e em seu belíssimo “Eterno Amor”. Obras que trazem sua personalidade estampada nos diálogos que sempre passeiam pelo deslumbre do improvável, na direção segura e inovadora, ou na fotografia saturada e sempre insanamente colorida.

Em “Mimacs – Um Plano Complicado”, o diretor ironicamente chega descomplicando tudo, trazendo uma história relativamente simples, que não se leva a sério em momento algum. Ela começa nos apresentando Bazil, um pobre infeliz que, após levar uma bala perdida na cabeça (que permaneceu alojada por lá mesmo), vê sua vida virar de pernas para o ar. Enquanto ficou internado para cuidar de seu ferimento, ele tem todos os bens roubados de sua humilde moradia, além de perder o emprego na locadora de vídeos.

Com uma mão na frente e outra atrás, o destino de Bazil acaba sendo morar na rua, e lá conhece Placard, um velho presidiário boa praça que trata de apresentar o jovem mendigo para uma verdadeira gangue de maltrapilhos que vive em uma fortaleza feita de sucata. Unidos, eles formam uma grande e disfuncional família, que consegue tirar do lixo seu sustento, além de outras coisas um tanto quanto incríveis, por sinal.

O fato é que Bazil quer vingança. Quando criança, ele perdeu o pai, vítima de uma mina terrestre no oriente médio. Além disso, toda sua dignidade foi para o ralo depois do maldito tiro acidental que levou, ou seja, os verdadeiros vilões desta história são os mercadores da morte Nicolas Thibault de Fenouillet (dono da “Les Arsenaux D’Aubervilliers”, empresa fabricante da bala alojada em sua cabeça) e François Marconi ( dono da “La Vigilante De L’Armement”, empresa fabricante da mina terrestre que matou seu pai). Coincidentemente, as duas empresas concorrentes estão localizadas uma de frente para outra, como se estivessem se encarando para uma briga.

Começa então o plano mirabolante e complicado de Bazil, que é, basicamente, por meio de tramóias muito bem planejadas, e principalmente, bem executadas, colocar Marconi e Fenouillet em guerra.

Apesar do humor de excelente bom gosto, e do texto requintado (assinado pelo próprio Jeunet, juntamente a Guillaune Laurant), este não acaba sendo um dos melhores roteiros trabalhados pelo diretor. Claramente, a história ganha ares vertiginosos pelos rebuscados diálogos adotados, mas lá pelo meio do segundo ato, quando a trama está completamente exposta, o longa fica basicamente estacionado na elaboração de armadilhas e golpes, demonstrando um ar realmente despretensioso.

O grande diferencial é a direção brilhante de Jeunet, que eleva muito o nível da obra. Adotando seu peculiar tom melancólico, ele abusa, assim como em o “Ladrão de Sonhos” e “Delicatessen”, dos cenários poluídos e carregados, onde em meio à bagunça e o caos, sempre há um espírito acolhedor. Utilizando de um tom teatral, bastante mambembe, todas as tramóias são uma homenagem para aquela típica aventura cômica, de um “inspetor bugiganga” amalucado, mas não pelo fato da modernidade ou algo do gênero, a referência aqui é a excentricidade dos planos em questão. A trilha sonora funciona perfeitamente com o andamento, mas não chama tanta atenção como em suas obras anteriores.

O destaque entre o time de atores é com certeza Danny Boon, que interpreta o esquisitão Bazil. Estando em evidência na França, após o bem sucedido “A Riviera Não é Aqui”, sua interpretação demonstra todas as qualidades de um verdadeiro artista, onde a presença corporal é fator fundamental. Seguindo esta mesma linha temos também Julie Ferrier, uma contorcionista que da muita credibilidade para sua La Môme Caoutchouc. O time de coadjuvantes é grande, sendo formado por ótimos atores, como Dominique Pinon, velho colaborador de Jeunet, que aqui interpreta Fracasse, um maluco que sonha entrar no Guinness Book em diversos quesitos. Temos ainda Marie-Julie Baup como Calculette, garota nerd que, como o nome mesmo diz, é ótima em cálculos. Os atores André Dussollier e Nicolas Marié, que interpretam os vendedores de armas Fenouillet e Marconi, respectivamente, também trazem muita personalidade para seus personagens.

Com “Micmacs – Um Plano Perfeito”, Jeunet aparece despreocupado, e entrega uma obra prazerosa de se ver. Apesar de possuir uma trama básica, o roteiro é recheado de pequenos enfeites, lapidados com precisão pelo diretor francês, que vão desde os inovadores títulos iniciais até os bizarros fetiches de seus personagens. Estes detalhes, unidos a uma direção sempre apaixonada, fazem da obra uma peça diferenciada em nosso cinema atual. Vale a pena conferir.

Um evento pra morto-vivo nenhum botar defeito!

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Em 1968 o mundo conheceu o diretor George A. Romero e sua obra "A Noite dos Mortos Vivos”. Ele conseguiu criar uma obra prima do terror onde seres humanos mortos renasciam com uma fome insaciável por carne humana que se tornou sucesso no mundo todo e conseguiu uma legião de fãs. Quarenta e dois anos depois, e muitos mais filmes, livros, jogos de videogames, música sobre os cadáveres ambulantes depois, o mundo do terror criou uma coisa bizarra chamada “Zombie Walk” que acontecerá em Poços de Caldas – MG e você está convidado. Da uma olhadinha na explicação abaixo:

 

Crítica: The Runaways - Garotas do Rock

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Por Ronaldo D'Arcadia

O filme tenta tudo, menos retratar de forma satisfatória a história da banda.


 
Em 1975, um grupo de garotas resolveu colocar uma vírgula na história do rock. O conjunto The Runaways foi o primeiro formado apenas por mulheres, que cantavam um rock ‘n’ roll de qualidade e principalmente de atitude. Por trás do sucesso, como sempre, havia um mentor, chamado Kim Fowley, que construiu o visual da banda como ponto primordial, seguindo o conceito, já muito bem sucedido, “Sex Pistols” de ser. Mas isso não queria dizer que o som não era bom, muito pelo contrário. Mas depois de pouquíssimo tempo, quatro anos para ser mais exato, a banda terminou devido a conflitos, que se mostravam evidentes com a constante troca de integrantes.

“The Runaways – Garotas do Rock” apresenta a história da banda desde seu inicio (ou tenta), quando a vocalista e guitarrista Joan Jett conhece o produtor Kim Fowley e a baterista Sandy West, e posteriormente a baixista Jackie Fox (que no filme é substituida por uma personagem fictícia chamada Robin), a guitarrista Lita Ford e a sedutora vocalista “sweet sixteen” Cherie Currie.

O filme passa pelos seus olhos sem dizer nada e nem deixar saudades. Montando os fatos de forma precária e ilusória, não conseguimos nem ao menos captar um terço da essência da banda verdadeira. Baseado no livro "Neon Angel: The Cherie Currie Story", escrito pela própria Currie, fica a dúvida se a obra é sobre a vocalista e sua parceira Joan Jett, ou um retrato da banda. Dos ensaios para o sucesso, do sucesso para as drogas, das drogas para os conflitos e o inevitável fim. Tudo comprimido de forma incrivelmente medíocre, com as outras integrantes sendo simplesmente extirpadas do processo.

Claramente que todos os olhos estão voltados para as garotas prodígio Dakota Fanning e Kristen Stewart, interpretando Cherie Currie e Joan Jett, respectivamente. Apesar do talento das garotas, o resultado, assim como todo o filme, é desprovido de alma própria. Enquanto Fanning parece desconfortável ao se despir, literalmente, da inocência de outrora - onde falava com animais e era sempre inteligentemente fascinante-, Stewart se sai um pouco melhor com a masculinizada Jett, mas apesar de entregar uma interpretação satisfatória, seus trejeitos de garota tímida (que já estão se tornando um cacoete) acabam minando o resultado final, mostrando que sempre tem um pouco de “Bella” em suas personagens.

Já Kim Fowley, interpretado pelo sempre excêntrico Michael Shannon, é um refresco, apesar de que, com um tempo de projeção, sua chatice se torne um fator limitante. Claramente que o produtor, assim como todos bons vendedores de celebridades da época, devia ser um sujeito intragável, mas seu repetitivo incentivo a banda, baseado apenas em insinuações sexuais, acabam em certo momento cansando. Mas no geral seu personagem é de longe o melhor.

Já as outras integrantes simplesmente não existem. Como já foi dito, a baixista Jackie Fox não quis ser nem ao menos citada no filme, sendo substituída pela ficcional Robin, que entra e sai calada. Lita Ford, a guitarrista virtuosa de cabelos lisos, tem suas únicas aparições direcionadas à posição de chata e vilã, o que fica explicito em uma cena final, onde o senso do ridículo é simplesmente ultrapassado. Lita também não se envolveu com o filme, claramente. Sandy West, que morreu em 2006, tem uma partipação um pouco mais relevante, mas sempre caricata e sem profundidade.

Os pontos positivos do longa vão para a produção, que modela com perfeição o visual das garotas. O show no Japão é simétrico. Talvez o espírito de anos 70 pudesse ser melhor trabalhado, pois não sentimos tanto a viagem para aquela época devido ao caráter extramamente pop instaurado pelas atrizes principais, mas a trilha sonora arrasadora segura as pontas, com clássicos que passam por James Brown, The Stooges e David Bowie. Outro ponto positivo é o fato das atrizes, Fanning e Stewart, cantarem algumas canções, com um resultado convincente.

A direção de Floria Sigismondi é competente, mas desprovida de originalidade. Fica no feijão com arroz, tudo bem videoclipe, que é sua área. Já seu roteiro, baseado no livro de Currie, como já foi citado, é uma afronta a história da banda, por resumir de maneira caótica sua cronologia, fazendo com que seu desfecho apresente um chilique ao invés de um rompimento.

Joan Jett e Cherie Currie tiveram uma posição importante na história da música, pois foram as primeiras representantes feminas enfáticas do rock ‘n’ roll marginal da época. Joan Jett, depois de terminar com a The Runaways, gravou alguns dos clássicos mais maneiros do rock, como “I Love Rock ‘n’ Roll”, "Crimson and Clover" e “Bad Reputation”. Com o filme, o valor das musicistas é de longe explorado, e apesar delas serem as únicas visadas na produção, com certeza a intenção de reelembrar a época perdida foi uma decepção.

Crítica de Cinema: O Garoto de Liverpool

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Por: Ronaldo D'Arcadia

Um corajoso retrato da juventude problemática de um dos maiores gênios da música.


“Ele é um autêntico homem de lugar nenhum”. Este é o trecho inicial de “Nowhere Man”, música icônica de John Lennon que inteligentemente serviu de referência para o titulo original do filme em questão, “Nowhere Boy”.

Apesar da influência e do reconhecimento do compositor na história moderna, nunca antes um filme havia retratado de forma tão eficiente sua personalidade. Dirigido pela britânica Sam Taylor-Wood (em seu ousado trabalho de estreia), com o roteiro de Matt Greenhalgh, (responsável também pelo excelente "Controle - A História de Ian Curtis", que conta a trajetória do polêmico vocalista da banda Joy Divison), e baseado no livro “Imagine This: Growing Up With My Brother John Lennon”, escrito pela meia-irmã do Beatle, Julia Baird, o filme respira veracidade e referências marcantes da vida daquele que um dia ajudaria a transformar o mundo da música.

A história nos leva para a Liverpool dos anos 50, apresentando um jovem Lennon (Aaron Johnson) que ainda não entendia nada de música. Para aqueles que conhecem um pouco da história do cantor, sabem que sua juventude foi extremamente tumultuada. Ele foi criado pela famosa tia Mimi (Kristin Scott Thomas), típica dona de casa da classe média britânica, com emoções e atitudes contidas, algumas vezes ásperas e frias demais. Apesar da postura rígida, Lennon se dava bem com ela, mas foi depois da morte de seu tio George (David Threlfall) que as coisas começaram a mudar. No enterro, ele viu a mulher que desconfiava ser sua mãe. De cabelos vermelhos, ela se chamava Julia (Anne Marie Duff).

Morando apenas algumas quadras de sua casa, Julia era peculiar. Lennon então se aproxima dela, sendo recebido de forma calorosa, ou podemos dizer exageradamente afetuosa, pois, sendo muito nova, ela mais parecia uma namorada do que mãe do garoto, devido aos constantes abraços e beijos dados entre os dois. Um inverso então se forma. Longe da rigidez de Mimi, Lennon aproveita seu tempo com Julia, que é a responsável por apresentar o famoso Rock ‘n’ Roll para o jovem. Apesar dos problemas que viriam a surgir em meio a essa disputa entre Mimi e Julia, a relação de Lennon com sua mãe se solidifica.
O roteiro é construído de forma muito inteligente. Os dilemas do rapaz, envolvendo sua busca pelos verdadeiros motivos do abandono da mãe, ou mesmo do silêncio da tia, são trabalhados de forma eficiente, com uma profundidade dramática excepcional, e ao mesmo tempo, seu amor pela música cresce de maneira orgânica. Sua evolução no banjo - instrumento que aprendeu a tocar com a mãe-, é perfeita. Depois disso vem seu primeiro violão, presente de Mimi, assim como sua primeira Hoffner.

Um conjunto começa a se formar. O “The Quarrymen” vai evoluindo conforme os novos integrantes vão surgindo. Primeiro é Paul McCartney (Thomas Sangster), em uma cena hilária, que se apresenta para Lennon (com certeza os fãs vão adorar). Depois Paul traz George (Sam Bell), muito habilidoso com a guitarra. Na época, Lennon mal sabia direito como tocar, mas já possuía muita personalidade. Com a entrada dos novos companheiros, principalmente McCartney, é que tudo começa a ficar mais sério. Os dois passam a treinar juntos e compor suas primeiras canções, como a ótima “In Spite of all the Danger”. Julia e Mimi sempre incentivaram Lennon, apesar de algumas vezes Mimi tirar o violão do garoto devido ao péssimo comportamento na escola. Enfim, tudo segue relativamente bem até o trágico acidente de Julia.

O time de atores se mostra inspirado. Aaron Johnson surpreende como John Lennon e capta perfeitamente a essência do cantor. Está tudo lá: a fala arrastada e o sotaque carregado, os olhos caídos enquanto faz alguma piada infame. Aparentemente é difícil enxergar Lennon no rapaz, mas ao visualizar a imagem do cantor, ainda jovem, no contexto da interpretação de Aaron, o resultado acaba sendo excelente. Sua atuação em “Kick-Ass: Quebrando Tudo” prova a versatilidade do ator. Mimi também está muito bem representada pela experiente Kristin Scott Thomas, que acha o tom exato para a personagem, fazendo que, mesmo com sua dureza, ela tenha um carisma inegável. Anne-Marie Duff também se sai muito bem com a complicada Julia. Sofrendo possivelmente de um transtorno bipolar, a mulher tem altos e baixos vertiginosos, sendo eles catalisadores de suas atitudes condenáveis.

Thomas Sangster segue a mesma linha de Aaron com seu McCartney. Com muita competência ele reproduz de forma verossímil seu personagem, apresentando os trejeitos, a fala mansa e coesa do astro (com as sobrancelhas sempre erguidas e a cara de bom moço). Sendo bem explorado, o filme faz referência a futuros atritos envolvendo mulheres em meio a banda, demonstrando a postura de líder que McCartney viria a ter junto a Lennon. Sam Bell acaba tendo pouco espaço com seu George, mas cumpre seu papel, como um guitarrista que está ali para aproveitar o momento ao máximo, muito diferente do homem sério e calado que iria se tornar. Com os atores cantando de forma eficiente, a obra apresenta ainda uma trilha sonora e incidental motivante, calcada nos clássicos dos anos 50. Uma verdadeira aula de música.

Com muitas referências, o filme é um prato cheio para os fãs, que logo no começo já notaram o acorde aberto e estridente de “Hard Day’s Night”. A produção se destaca também com a descrição dos fatos e da época. Para quem já viu fotos da “The Quarrymen” tocando em cima do caminhão em uma festa da cidade, vai notar a semelhança indiscutível. Outros momentos, citados diversas vezes por Lennon em entrevistas, marcam presença, como a referência a seu amigo Stu, grande influência para o cantor, e o dia em que foi ao cinema e resolveu virar um astro do rock, e por ai vai.

No final, “O Garoto de Liverpool” trata com respeito seu personagem principal. Amparado por um ótimo roteiro, podemos vislumbrar os problemas que fizeram de John Lennon uma pessoa tão complexa: a falta de identidade, um possível complexo de Édipo, as perdas e os momentos traumáticos. Por mais poética que a obra possa ser, ela resume bem esta fase importante na vida de Lennon e seus companheiros.
Além de presentear os fãs com uma cena emocionante nos momentos finais, protagonizada pelos amigos de banda, a diretora Sam Taylor-Wood mostra sua qualidade, alcançando uma condução competente e criativa. Alguns problemas existem, mas são praticamente relevados pela força da história que está contando. Apesar de todas as camadas, a direção capta aquilo que fez de Lennon um astro: sua simplicidade na hora de fazer música, que misturava a pureza do rock com a inovação do pop, ritmo contemporâneo alicerçado por ícones como Billie Holiday e Elvis Presley. Essa simplicidade é que o aproxima de todos, fazendo de suas canções obras inesquecíveis.

Crítica de Cinema: Wall Street - O Dinheiro Nunca Dorme

Posted by Programa Enter

Por: Ronaldo D'Arcadia


A ganância é uma coisa boa? A questão é relevante, pois afinal é ela (a ganância) que faz o governo de um país ir atrás de melhorias para seu povo, que faz o homem comum evoluir como ser humano, que incentiva você a não ficar parado no mesmo lugar. O problema maior é a linha tênue entre a ganância e a falta de ética e moral, duas virtudes que parecem não existir na cartilha dos investidores milionários.

Quem já assistiu “Wall Street: Poder e Cobiça”, viu uma das melhores atuações de Michael Douglas, que na época levou o Oscar para casa. O personagem Gordon Gekko é ironicamente cativante, com sua índole desprezível e sua lábia sociopata. Mas ele pagou o preço por suas fraudes e lavagens de dinheiro, e acabou preso, servindo de exemplo para os capitalistas selvagens que transitam em seus helicópteros por Nova York. Apenas em 2001 ele foi solto, sem muito dinheiro no bolso, barba por fazer, e um celular último modelo de 1987, pesando dois quilos no mínimo.

Avançando no tempo, mas precisamente em 2008, somos apresentados a Jake Moore (Shia Labeouf), jovem estereótipo de Wall Street, que apesar de sua vontade de fazer fortuna, é um idealista dos investimentos em energia limpa e sustentável, atitude que talvez seja o único motivo plausível do envolvimento com Winnie (Carey Mulligan), filha de Gekko, que despreza o pai e tudo que o rodeia. Ela, também uma idealista, trabalha fortemente com seu site ativista, divulgando verdades inconvenientes mundo afora.

Jake trabalha apostando em mercados financeiros na renomada Keller Zabel, que aparentemente passa por uma crise. Como o mercado não aposta em investimentos ”aparentemente” confiáveis, o preço das ações da empresa despenca, e Lois Zabel (Frank Langella), que comanda toda a bagunça, se reuni com o Banco Central Americano para tentar manter-se em pé. Dentro de um meio movido por interesses e rinchas antigas, Zabel é praticamente apunhalado na reunião, tendo sua empresa comprada por seu inimigo Bretton James (Josh Brolin), do banco de investimentos Churcill Schwartz, a preço de banana.

Gekko sabe tudo que se passa por trás da economia, entre problemas e falcatruas, apunhaladas e chantagens, e Jake, como pupilo de Zabel, quer ir a fundo no assunto e descobrir o que aconteceu realmente. Ele então se aproxima do sogro em busca de “consultoria”, e em troca promete tentar aproximar Gekko de sua filha. Uma troca “aparentemente” segura.

Entre muitas informações que estouram como “bolhas”, “Wall Street: O Dinheiro Nunca Dorme” é um bom filme. Usando como pano de fundo toda a agressividade velada de Wall Street, o roteiro conta a história de um homem que busca sua redenção, tentando voltar aos negócios e se aproximar de sua única filha, que o odeia e o culpa pela morte do irmão, viciado em drogas. É claro que Gekko mudou, mas não o suficiente, para nosso alívio.

Oliver Stone dirige esta sequência com muita atenção aos detalhes, fazendo ligações diretas ao seu primeiro filme, fato que pode ser observado já na abertura dos créditos. O destaque vai com certeza para a edição contemporânea e criativa, que traz os colossais prédios de Nova York formando gráficos financeiros, e por ai vai. Utilizando do humor de forma inteligente, a obra também é recheada de referências, como a participação de Bud Fox, interpretado por Charlie Sheen. Só de aparecer o público já cai na gargalhada, pois o ator mais parece estar a caminho de filmar algum episódio de “Two And a Half Man”, com um sorriso sacana no rosto, acompanhado de duas lindas garotas.

Um dos pontos que deixa a desejar é o drama entre o pai Gekko e a filha Winnie. Carey Mulligan, que já provou ser uma excelente atriz com sua interpretação em “Educação”, parece meio desconfortável no papel da ressentida filha, que hora odeia, hora se rende facilmente aos argumentos do pai, sendo que no final sua personalidade parece forçada, e seu texto também não ajuda. O resto do elenco se sai bem melhor. Shia Labeouf, que ainda paga o preço de ter vendido sua alma ao Michael Bay, é um bom ator, que trabalha com humildade seu Jake Moore, não entregando um rapaz onisciente e arrogante, inteligente sim, mais ainda com muito a apreender. Michael Douglas não consegue repetir o êxito total de seu primeiro Gekko, mas com um personagem desses fica difícil errar. Talvez Douglas tenha ficado menos inescrupuloso com o passar dos anos, assim como seu personagem, mas no geral, suas tramóias continuam dignas de mestre. Temos ainda Josh Brolin como Bretton James. O ator, que já trabalhou com Stone em “W.” (obra que ainda não deu as caras no Brasil), está muito bem e mostra confiança como um perfeito cretino engravatado. Destaque para Frank Langella com sua pequena e excelente participação como Lois Zabel. Susan Sarandon também aparece como a mãe de Jake, mas sua personagem acaba sendo pouquíssima explorada.

“Wall Street: O Dinheiro Nunca Dorme” não supera seu antecessor, mas funciona. Com uma trama elaborada - que traz a bolha financeira como personagem importante-, o filme derrapa no drama, mas convence na dinâmica e fluidez da trama geral. Com boas interpretações, uma direção segura e edição competente, a obra agrada a todos, e é um prato cheio aos interessados pelo tema. A ganância é uma coisa boa? Assista e tire suas conclusões.

O mundo dos investimentos não teria a menor graça sem Gordon Gekko.