Archive for novembro 2010

Crítica: Scott Pilgrim Contra o Mundo

Posted by Programa Enter

Por: Ronaldo D'Arcadia

Insano, barulhento, acelerado. Este filme é uma festa para os olhos daqueles que buscam mais vida e atitude no cinema moderno.

“Scott Pilgrim Contra o Mundo” pode ser considerado um filme destinado para um público específico. Talvez o longa seja demais para aqueles acostumados a uma história mais linear e, fatidicamente comum, fato que explica a fria recepção lá fora. Baseado no aclamado graphic novel de Bryan Lee O'Malley, o filme conta a história de Scott Pilgrim, baixista arrasador, conquistador nato e exímio lutador. Depois de idas e vindas de sua vida amorosa, ele parece ter encontrado a garota de seus sonhos (literalmente). Ramona Flowers é tudo aquilo que um rapaz descolado quer: misteriosa, independente, espontânea e cheia de atitude, o único problema são suas cicatrizes de guerra, ou seja, seu passado amoroso, constituído mais especificamente de sete ex-namorados do mal, todos empenhados em destruir seus relacionamentos (novamente, literalmente). Fica então a cargo de Scott defender sua posição e assim derrotar esta liga barra pesada, para no final ter o caminho livre com Ramona.

Primeiramente é importante frisar, para os fãs da graphic novel, que muita coisa foi transformada. Algumas com um resultado muito positivo, outras nem tanto. Seguindo praticamente ao pé da letra o primeiro volume “Precious Little Life” (fundamental por explorar o inicio do relacionamento de Scott e Ramona), o texto acaba dando aquela embolada básica em todo resto. Tendo 112 minutos de projeção, com uma hora de filme Scott acabou de enfrentar Lucas Lee, o que exemplifica um pouco como o filme teve de correr com sua finalização. Mas no geral, o roteiro de Michael Bacall e do diretor Edgar Wrigth funciona bem, não é perfeito, pois após o primeiro ato impecável, o filme dá uma pequena caída no rendimento, mas suas soluções acabam sendo de bom gosto até o desfecho.


Mas com certeza o grande diferencial da obra é a parte técnica. A direção de Wright é eletrizante. Tendo os excelentes “Todo Mundo Quase Morto” e “Chumbo Grosso” em seu currículo, o inglês eleva a quinta essência o apuro visual, muito diferente da obra original, que opta por um estilo mais cult, todo em preto e branco. Utilizando de efeitos fantásticos, o quesito “game” é realmente debulhado de todas as maneiras possíveis. Juntamente a isso, onomatopéias saltam freneticamente em todos os sons, transformando tudo em uma grande HQ. É a união perfeita entre duas vertentes que nunca haviam sido exploradas de forma tão enfática até hoje. Ainda com muita criatividade, diversos outros elementos pop são inseridos de forma inusitada, como uma homenagem ao seriado “Seinfield”, simplesmente perfeita, a vinheta da Universal em “8bits” também arrasa, ou mesmo toda a parte musical que, apesar de não ter as mesmas letras e possuir mais de três notas (diferentemente da HQ), funciona de forma excepcional. Punk rock misturado com british rock, uma doidera só.

A edição e montagem rápida e insana, herança do cinema inglês de Guy Ritchie, aqui é reinventada. Sendo parte fundamental do êxito visual, suas passagens e cortes bruscos dão a continuidade frenética e muitas vezes não linear do filme. Muita qualidade também na direção de arte, onde as cores ganham vida de forma incrível. Trilha sonora contagiante, efeitos especiais inesquecíveis. O filme se sai bem em todos os quesitos.

O time de atores também é destaque. Michael Cera foi a escolha certa para o papel principal. Com cara de nerd, franzinho, e com um “timing” para comédia diferenciado, seu Scott tem o carisma necessário para conquistar o público. Ele trabalha muito bem todos os dilemas reais de uma geração, se tornando assim um símbolo de fácil associação. Mary Elizabeth Winstead também se sai bem como Ramona. Além de parecer muito com a figura da HQ, sua seriedade contrasta paralelamente com seu charme, e sua busca por um relacionamento verdadeiro se torna uma motivação perspicaz, mediante ao público que busca atingir. Não menos importante, e se destacando dos demais, temos Ellen Wong como a perseguidora apaixonada de Scott, Knives Chau. A atriz imprime trejeitos irresistíveis para a personagem, passeando facilmente entre a menina meiga e a louca varrida. Já entre os amigos de banda de Scott temos Alison Pill como a durona e hilária baterista Kim Pine, Mark Webber é o talento paranóico Stephen Stills, e Johnny Simmons é o sonso boa gente Young Neil, também com um humor de qualidade, chamando a atenção.

No time dos vilões estão nomes de peso como Chris Evans, interpretando o mala Lucas Lee, Brandon Routh é o poderoso vegano Todd Ingram, e o excelente Jason Scwartzman aparece influente como Gideon Graves. Outros destaques são Kieran Culkin como o impagável gay descolado Wallace Wells (roubando a cena), Anna Kendrick interpreta a irmã fofoqueira Stacey Pilgrim, Brie Larson é a sedutora Envy Adams e Aubrey Plaza faz a desbocada Julie Powers. Um time de peso. Diversos personagens que incrivelmente são todos bem explorados, na medida do possível.

“Scott Pilgrim Contra o Mundo” adapta sua história de forma respeitável. Apesar de comprimir muito coisa, a obra se fortalece nos detalhes, em todo o apuro visual, na direção perfeita de Edgar Wright, e nas interpretações eficientes de seus atores, uma pequena obra prima cult. Com suas influências calcadas no mangá, nos games vintage (com suas moedinhas e tudo mais) e no mundo musical frenético, a obra tem tudo para atrair os jovens brasileiros. Embora tenha sido recebido de forma pouco positiva mundo a fora, o filme com certeza tem um valor inestimável para aqueles que buscam algo diferente em meio à normalidade muitas vezes cansativa dos blockbuster’s em geral.

Crítica: Um Parto de Viagem

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Por: Ronaldo D'Arcadia

Tudo é possível quando Todd Phillips resolve unir Galifianakis e Downey Jr. em uma viagem cruzando os EUA .

Para aqueles que achavam que “Se Beber não Case” foi um golpe de sorte orquestrado por Todd Phillips, “Um Parto de Viagem” veio mostrar que realmente não foi. O diretor, que possui outros trabalhos medianos em seu currículo (nada muito significativo), parece ter encontrado o tom exato para fazer comédia de qualidade, onde, mesmo sendo muitas vezes apelativo, não perde a linha em momento algum.

Basicamente estruturado no modelo “road movie”, o filme começa junto com o dia de Peter Higman, um arquiteto que precisa voar de Atlanta para Los Angeles e acompanhar o nascimento de seu filho, que ocorrerá nos próximos dias. Preparado para viagem, Higman podia esperar por tudo, menos o que iria realmente lhe acontecer: conhecer Ethan Tremblay, um pretenso ator que usa permanente e sonha ir para Hollywood fazer muito sucesso, com seu cachorrinho Sonny a tira colo.

O primeiro encontro dos dois já é literalmente um acidente, de carro, na porta do aeroporto. Após cinco minutos de conversa, que já proporcionam alguns inconvenientes para o arquiteto, ambos se vêem juntos, muito próximos, no mesmo vôo. Novamente, devido a Tremblay e uma palavra mágica dita dentro do avião (palavra que pode te expulsar de qualquer aeroporto dos EUA e te mandar direto para cadeia), a dupla é expulsa e colocada na lista negra das companhias áreas. Com as bagagens despachadas e sem os documentos, perdidos na confusão, Higman se vê sem alternativas de prosseguir até Los Angeles. É quando surge novamente Tremblay, com seu carro alugado, um pedido de desculpas e uma carona garantida para o suposto novo amigo. O resto é uma sequência de acontecimentos absurdos e hilários, uma verdadeira epopéia a ser lembrada para sempre pelos dois companheiros de viagem.

Todd Phillips coloca então, frente a frente, a sanidade do arquiteto versus a loucura do ator. Mesmo seguindo algumas regras já meio batidas do gênero, o roteiro se mostra muito bem trabalhado, centralizando toda sua força nos ótimos e elaborados personagens, principais e secundários. Ao longo da jornada somos expostos a todos os quesitos obrigatórios do humor politicamente incorreto: piadas com cadeirantes, crianças mal educadas, acidentes, e muitas, mas muitas besteiras ditas, além de uma cena incrível, ao som de Pink Floyd, onde o “remédio” de glaucoma de Tremblay (conhecido também como THC) dá um tom alucinógeno e inesquecível para jornada. Contrastando com o humor de primeira, o texto também explora de forma eficiente os dramas de seus personagens, nos levando a entender e nos afeiçoar ainda mais por eles, como a forte relação entre Tremblay e o pai, que para o bem ou para o mal, foi o responsável pela personalidade extremamente irritante do individuo.


O destaque é com certeza Zach Galifianakis. Depois de chamar atenção com seu débil Alan Garner, de “Se Beber não Case”, o ator retoma a parceria com Phillips, agora como protagonista. Seu Ethan Tremblay é incrível. Muito bem construído e estruturado, suas esquisitices vão ao extremo, desde sua aparente alienação mediante ao mundo ao seu redor, como seus improváveis e intermináveis costumes bizarros. Acompanhado de seu cachorro Sonny (que também tem seus momentos estranhos), o usuário compulsivo de remédio para glaucoma é responsável por todas as desgraças que acontecem estrada a fora. Com muita responsabilidade, Galifianakis se tornou Tremblay. Ele ficou tão bem, que muitos podem pensar que o ator é o personagem, e talvez até seja, pois o papel parece ter sido talhado visando sua excentricidade óbvia.

Junto a ele está ninguém menos do que, o novamente ator do momento, Robert Downey Jr., que também dá um show. Interpretando um papel muito mais contido, ele é a ira do público, o saco cheio prestes a explodir. Com a mesma personalidade de sempre, Downey Jr. humilde mente abre espaço para Galifianakis brilhar, o que é fundamental para obra, fazendo desta união improvável uma química perfeita.

Temos ainda aquelas pequenas participações (obrigatórias em todo “road movie”) que dão um brilho especial ao longa. Juliette Lewis aparece hilária como a vendedora de remédio para glaucoma Heidi. Danny McBride surge revoltado como o soldado Lonnie, que voltou do Iraque não levando desafora nenhum para casa. Sua cena é uma das melhores do filme. Por fim, Jamie Foxx interpreta o amigo Darryl, e é o menos aproveitado dos coadjuvantes, mas tem seus momentos. Recheado de referências, o filme faz ainda uma homenagem criativa e inteligente ao seriado “Two and a Half Man”. Com certeza um ponto a mais para quem é fã de Charlie, Alan e Jake.

A trama de “Um Parto de Viagem” pode parecer simples, pois tem destino certo, com seu ponto de partida e chegada já estipulados. Mas a criatividade e o humor de qualidade do diretor e roteirista Todd Phillips são, sem dúvida nenhuma, um diferencial. Com ótimos atores se divertindo em cena, direção competente e trilha sonora contagiante, o filme é, juntamente com “Se Beber Não Case”, uma das melhores comédias do ano.

Crítica: Machete

Posted by Programa Enter

Por: Ronaldo D'Arcadia

Robert Rodriguez tenta fazer um filme bom que parece ruim, mas consegue ser apenas ruim.

 


Respeitado por obras memoráveis como “Um Drink no Inferno” e “Sin City”, o amigão de Quentin Tarantino, Robert Rodriguez, é um verdadeiro fanfarrão. Sempre imprimindo em seus filmes aquele clima “B” de se fazer cinema - herdado de seu “El Mariachi”, que com pouquíssimos recursos ganhou visibilidade mundial -, o diretor aqui parece se confundir, fazendo com que o ruim seja apenas ruim.

A idéia de “Machete” surgiu após o alvoroço provocado pelo trailer falso exibido antes da projeção de “GrindHouse” (“Planeta Terror/ A Prova de Morte”), que fez em parceria com Tarantino. O apelo foi tão grande, que o diretor resolveu tirar o projeto do imaginário mundo “fake” e lançá-lo na realidade. Dividindo a direção com o desconhecido Ethan Maniquis - que sempre trabalhou na área de edição e efeitos visuais -, Rodriguez não se mostra consistente como em seus outros trabalhos, apresentando apenas uma cena inicial arrasadora, e prosseguindo de forma trôpega e sem graça até o final.

Tudo começa com o personagem Machete, um policial mexicano honesto e brucutu, que vê sua família ser violentamente assassinada pelo sarcástico Torrez (chefão do crime organizado local), despertando assim o mais puro ódio calcado no desejo de vingança. Com a policia corrupta a favor de Torrez, Machete foge para os Estados Unidos, e lá tenta tocar sua vida. Tudo isso até uma oportunidade única bater a sua porta: Ele é contratado para matar o Senador John McLaughlin, ativista insano que luta contra a invasão ilegal de mexicanos no EUA de forma terrorista. As coisas não saem como haviam sido planejadas, e Machete terá de se virar para sair dessa arapuca em que se meteu, e ainda acertar suas contas com o passado.

Com um roteiro precário, que basicamente faz do acaso uma fada madrinha, o filme nos faz esperar por uma cena tão boa quanto a inicial, mas ela nunca vem. Claramente que Rodriguez tenta fazer das coincidências, incrivelmente convenientes, um fator cômico na trama, mas o resultado não surge este efeito de forma eficaz. No final, a única força motriz da obra está em alguns personagens inusitados que possuem brilho próprio, mas pouco desenvolvimento dentro da história.

Machete é perfeito. Frio e calculista, ele ironicamente, ao mesmo tempo em que pica seus inimigos como um psicopata, tem uma personalidade honrada, além de pegar a mulherada, mesmo com sua cara mal acabada. Danny Trejo, que interpreta o personagem, se sai bem pelo simples fato de reconhecer que não é um bom ator, por isso parece satisfeito em não proferir mais de dez frases durante o filme todo, um verdadeiro exterminador do futuro versão mexicano. Na pele do senador John McLauglin temos ninguém menos que Roberto De Niro. Seu personagem é puro estereótipo, e o ator se vira para tentar torná-lo mais atraente, mas passa longe de ser um vilão digno de nota. Junto a ele, no time do mal, está Jeff Fahey, este sim mais caricato e engraçado com seu Michael Booth, sendo o bandido mais enfático da fita.

Temos também Michelle Rodriguez como Luz, uma bela revolucionaria que luta pelos diretos dos ilegais. Sua personagem é visualmente emblemática, com suas roupas escassas e seu tapa olho chamativo, um refresco no longa. Já Jessica Alba está caricata com sua agente especial da “La migra” Sartana Rivera, e não desperta nenhum carisma, contribuindo muito pouco com o resultado final. Lindsay Lohan (pós-clinica) está muito bem com sua vingativa April Booth, justiceira que veste o hábito de freira e mata criminosos a sangue frio. Junto a ela, também de batina, o eterno maluco Cheech Marin aparece como Padre Cortez, melhor personagem, que também merecia um filme só dele. Para fechar temos o terrível vilão Torrez, interpretado pelo experiente, mas pouco versátil Steven Seagal. Apesar de sua qualidade muito limitada, o ator entrega o papel de sua vida, com um desfecho que, de tão ridículo, se torna hilário.

“Machete” com certeza embutiu esperanças em todos os fãs de “cult movies” mundo a fora, mas com poucas cenas boas e uma história simplória e esquecível, somos obrigados a ser realistas e constatar que o filme é simplesmente ruim. No final, talvez este seja o grande desejo de Rodriguez, de que o filme seja realmente ruim, para assim, de uma forma diferenciada, ele se torne inesquecível. Vai saber.

MATÉRIA ESPECIAL

Posted by Programa Enter